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31 outubro 2023

Viajando pelo Brasil: Meu afastamento e passear como um respiro da rotina

✎ Por Mayara Gonçalves
Mayara Gonçalves em suas aventuras pelo Nordeste e Sul do Brasil!

Se você assistia a Supernatural, deve lembrar que toda recapitulação de temporada ou nova temporada começava assim... Pois bem!

A estrada até aqui!

Durante 2023 estive ausente por alguns meses do Fala, Prô! por questões pessoais. Afinal, o sistema no qual estamos inseridos não perdoa ninguém. Na maior parte do tempo minha cabeça esteve no trabalho que desempenho fora do contexto do nosso blog e nas minhas relações. Além disso, cortei um dobrado (que ainda está em curso) para lidar em terapia com as dores psíquicas, síndrome de impostora e rejeições de todos os tipos - bastante reforçadas diariamente pela nossa estrutura social capacitista, com a qual lido desde a infância. 

Durante boa parte do ano, simplesmente senti que fiz tudo, mas não adiantou nada. Porque ainda estou no mesmo ponto - muito mais calejada, mas ainda assim no mesmo ponto. Sinceramente, não há nada pior do que se saber boa no que faz e em como se relaciona com o mundo e com as pessoas, mas simplesmente se sentir travada no mesmo contexto, na mesma rotina e realidade que te adoece. Quão desafiador é ter que lidar com o tempo que as coisas demoram para mudar. Porque, diferente daquilo que hoje somos levados a acreditar, certas coisas não dependem só de amor, esforço, genialidade e grandes números. No lugar disso, a vida em si precisa de muita paciência, choro, terapia, espera, força para cortar aquilo que não faz mais sentido e uma pitada certeira do famoso QI (Quem Indica). 

Entretanto, ainda estou aqui lutando, tentando achar paz em meio ao caos. Sei que há muito o que fazer, o que resolver na minha vida pessoal e profissional, mas só pensar no não feito é o que me deixa maluca. Então hoje vamos falar do feito. Do feito que sempre me salva e me ajuda a respirar melhor: minhas viagens de férias. Ao escrever essas ultimas palavras, minha cabeça na realidade está assim:

"Meu Deus, só você sabe como eu queria ser rica para tirar um ano sabático, casar com meu noivo e montar minha vida em um lugar lá longe, mais acessível e feliz, com outro rítmo de vida e sem me importar com os problemas que não são meus!"

O problema é que eu não vou ser rica e nem tirar um ano sabático porque estamos no capitalismo selvagem ainda, onde eu sou só um peão que será descartado a qualquer momento. Ninguém se tocou que esse sistema é uma merda e, por isso, vou ter que trocar a roda desse carro com ele andando de novo. Então bora lá! Se dar conta de todo esse caos e ainda assim ver sentido em fazer algo para tentar sair dele é um desafio. Se dar conta de que certas dores sempre vão existir e que vamos senti-las independente do que façamos, também é. Por isso, durante esse ano aprendi que essa minha paixão por viagens talvez seja uma busca, já em curso, por esse lugar de paz. Essa minha paixão por viagens não sou só eu levando minha tristeza, frustrações e não feitos para passear, mas sim eu abrindo minhas próprias portas. 

Vivências no Nordeste: tudo muito lindo… Pena que não para todas/os!

Tive a oportunidade de viajar para o Nordeste durante o mês de junho, ficando em Maceió por uma semana. Por lá, temos um povo acolhedor e incrível, cujas mazelas impostas por uma má administração de recursos (e o amplo coronelismo) trazem um descaso enorme.

Com uma terra fértil e próspera como vi lá (diferente do que nos ensinam nas escolas), seria muito mais incrível se os seus recursos e frutos fossem revertidos para o bem do povo. Afinal, pouco importaria se uma refeição simples para 2 pessoas custa cerca de R$100 reais, se a gente soubesse que o povo dá conta de comprá-la e que essa grana vai para eles no fim das contas. Vai para infraestrutura, vai para o turismo e para tornar as praias e belezas naturais mais acessíveis. Mas a verdade é que não vai. Especialmente quando conversamos com a população ribeirinha, da Foz do Rio São Francisco, o que vemos é que essas pessoas estão, como eu, lutando para sobreviver em meio ao caos. 

Porque aquelas terras e aqueles corações foram esquecidos. Foram privados do básico, do afeto e reconhecimento e hoje lutam para sobreviver com unhas e dentes - mas são um povo machucado porque essa luta cansa e o resultado maior do bem-estar não vem. Saí de lá com essa sensação de que há muito o que fazer e não podemos descansar. É aí que na minha cabeça vem o sentimento: "Mas eu já fiz tanto… não sei o que mais eu faço. Tô tão cansada."

Tenho vontade de ver como é a vida em outras capitais ou cidades nordestinas para fazer um tira-teima adequado. Mas voltei dessa viagem com um incômodo gigante (e os boletos também), por ter percebido essas injustiças e estar cansada demais para lutar.

Algumas perguntas surgiram depois dessa vivência: O Nordeste sempre salva o Brasil em todas as eleições. Cadê o reconhecimento, a infraestrutura e a paz que eles merecem por isso? Será que o custo de vida seria tão alto os recursos fossem bem distribuídos? Será que o mesmo lugar que é considerado o Caribe Brasileiro precisaria ter praias fechadas, onde só se entra pagando, onde só se vê mansão de global e os nascidos por lá só entram para trabalhar? Por que nenhuma dessas praias tem passarelas que a tornem acessíveis se rola tanto dinheiro por baixo dos panos? Quantas são as pessoas que saem de lá em busca de uma vida melhor em São Paulo e encontram uma versão piorada do pensamento liberal/capitalista? Para o mundo que eu quero descer!

Vivências no Sul: desacelera que dá! 

Já em outubro fui a Curitiba, no Sul do Brasil. Além disso, dei uma rápida passada em Santa Catarina para realizar um sonho de infância. Em comparação com São Paulo e Maceió, meus dias em Curitiba foram incríveis. Como é bom viver em um lugar organizado, em que as pessoas não vivem amontoadas, não se trabalha exaustivamente, o custo de vida é baixo, tem muito rolê cultural, o lugar mais longe fica a 20 minutos e a acessibilidade é minimamente levada em conta. Nem sabia que isto era possível no Brasil!

Pense numa São Paulo melhorada. Não é atoa que foi eleita a melhor capital para morar! É isso que é Curitiba. E eu me recuso a acreditar que aquele lugar tem maioria direitista/extremista, porque fomos muito bem recebidos. Saí de lá com a sensação de ter encontrado onde quero morar e de que é possível desacelerar e mudar de vida agora mesmo. Óbvio que isso é uma das ilusões de viajante, porque todas as cidades têm seus problemas e um dos mais evidentes de lá é que praticamente só tem branco - e isso é inadmissível! Além disso, tenho o fato da passabilidade. Porque apesar de PCD, eu sou branca e meu noivo também!

E, por fim, de nada vai adiantar eu ir pra lá, se minha rotina de trabalho for a mesma. Nem vai dar tempo de aproveitar a cidade. "Um problema por vez, Mayara. Se não você pifa de novo." Atualmente estou em falta com meu eu lutador, porque descansar é só o que quero fazer. Mas mesmo assim é muito bom saber que existe um lugar onde (aparentemente) eu posso ser uma senhora que toma café e lê seu livro em um dos bosques da cidade sem enlouquecer pensando naquilo que ainda não resolvi. 

Aprendi que não quero mais fazer um milhão de coisas somente para me salvar, entregar resultados e construir uma família feliz. Mas sim que a movimentação faz parte da busca e um dia esse ritmo impossível vai ter fim. Ideal mesmo seria se em todo o nosso país (e quem sabe em outro sistema de organização da vida) fosse possível viver dignamente, né? Com condições. Sem distinções e discriminações dos mais variados tipos.

Por isso, até nessa experiência em Curitiba ficaram algumas questões: Tudo é tão perfeitamente colocado e montado naquele lugar. Será que é que nem o meme do Homer, que tá bem vestido na frente e desarrumado atrás? Por que afinal quase não tem preto nessa cidade? Não faz sentido algum em um país como o nosso. Várias perguntas para as quais não tenho uma resposta. 

Tomara que ao longo da minha trajetória, possa voltar aqui e contar pra vocês em breve que, para além de achar um contexto melhor para viver, eu consegui me inserir nele e recobrar minhas forças de luta. Mas isso são cenas dos próximos capítulos, que convido vocês a continuarem acompanhando!



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