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18 abril 2021

A influência do ambiente escolar na construção de autoestima da pessoa com deficiência

✎ Por Mayara Gonçalves

Falar de autoestima é também adentrar a complexidade da mente e das relações humanas. Se pararmos para pensar em quando e como ela começa a ser construída, chegaremos à conclusão de que, desde que nascemos, somos influenciados por fatores que vão determinar nosso comportamento e a forma como olhamos para nós mesmos.

Estudantes com deficiência em Tonga, país integrante da Polinésia. Fonte: Flickr

Conversar sobre o assunto é também entender que o significado da palavra autoestima é por vezes simplificado pela sociedade. Diferente do que muitos pensam, ter autoestima não é algo relacionado apenas à estar satisfeito com a própria imagem física - para exemplificar melhor, aqui temos um gráfico. Como vocês sabem, eu não tenho uma formação na área de psicologia. Mas no texto de hoje pretendo refletir, enquanto PCD, sobre o papel da escola na construção da autoestima, sem perder de vista um dos maiores vilões deste contexto: o bullying.

O entendimento do corpo perfeito e o bullying contra a PCD

Apesar de ter dito anteriormente que a noção de autoestima não está relacionada apenas à imagem física, é certo dizer que ela acaba sendo responsável por suscitar as primeiras reflexões sobre o assunto, ainda na infância. É importante lembrar que essa é uma fase onde a personalidade ainda está em formação e é muito influenciada pelas relações externas. Então, se em família ou na escola recebemos críticas sobre alguma característica física ou aprendemos a criticar o outro, acabamos guardando aquilo e tomando como verdade, muitas vezes por um bom tempo de nossas vidas. 

Bullying não! Ser diferente é legal, do Canal da Charlotte

Sabemos que qualquer corpo que seja considerado fora do padrão imposto pela sociedade pode sofrer bullying, justamente porque ela até hoje não se preocupou em incluir, acolher e respeitar a todos, independente de suas características ou condições. Trazendo a reflexão especificamente para o recorte da pessoa com deficiência, a verdade é que sofremos por estar em uma sociedade que ainda orienta suas crianças de maneira capacitista, normalizando esse tipo de conduta. Porque, se crianças com deficiência são ofendidas por causa de uma característica física sobre a qual não têm controle e este ato não é corrigido, elas passam a duvidar das suas capacidades. Assim, para além das questões emocionais, ainda é necessário lidar com a falta de acessibilidade, que agrava a sensação de inferioridade despertada pelo bullying.

01 abril 2021

A dança como recurso de aprendizado escolar e apropriação do corpo no contexto da pessoa com deficiência

✎ Por Mayara Gonçalves

Hoje é dia de abordar um assunto muito legal aqui no Fala, Prô! A dança é uma incrível forma de expressão dos seres humanos e fala muito sobre a cultura e sobre o modo como lidamos com nossos corpos em um contexto social.

Imagem meramente ilustrativa. Fonte: Cliff Booth no Pexels.

Gosto de pensar na dança como uma extensão da revolução que a música faz em nossos corações. Prova disso é que todo mundo já se empolgou ao ouvir uma música que gosta e começou, pelo menos, a bater o pezinho debaixo da mesa, né? Assim, é interessante pensar em como o hábito de dançar impacta no processo de apropriação do corpo e aprendizagem escolar da pessoa com deficiência. 

Desmistificando a dança no contexto da PCD

Neste momento pode passar pela sua cabeça a seguinte questão: “Mas pessoas com deficiência podem dançar?” e a resposta é SIM! Pessoas com qualquer tipo de deficiência podem “mexer seus esqueletos”. Há quem fique surpreso com esta afirmação, já que não é comum encontrar PCDs dançando em festas, baladas e bares (fruto do horrível e velho capacitismo, infelizmente!), mas muitas pessoas com deficiência amam dançar e, mais importante que isso: cada uma dança do seu jeito!

Clipe da música Novo Normal, do DJ Dennis, com a participação de Vanessa Andressa e Pequena Lo

A questão aqui é que muitos PCDs nem sabem que gostam de dançar. Afinal, numa sociedade padronizada, acabamos nos fixando em certos movimentos de dança entendidos como “bonitos” e “adequados” para essa atividade. Assim, perdemos toda a magia da experimentação que mora no ato de dançar. Eu mesma só descobri que gosto de dançar (do meu jeito) há uns 3 anos, quando comecei a sair mais com amigos. Isso foi muito valioso porque me reconectou com algo que eu já tinha desde pequena, mas de uma forma diferente. 

25 fevereiro 2021

Estatuto da pessoa com deficiência na escola: reflexões sobre inclusão escolar

✎ Por Mayara Gonçalves

Criado em 6 de julho de 2015, o Estatuto da Pessoa com Deficiência vigora desde 2 de janeiro de 2016 e existe para assegurar os direitos do PCD e orientar as demais esferas sociais no desafio de promover a inclusão.

Imagem meramente ilustrativa. Fonte: MedLine Plus.

Quando paramos para pensar nessa questão, a discussão naturalmente se torna mais complexa, especialmente quando olhamos para o contexto escolar. Sobre esse tópico, o Estatuto da Pessoa com Deficiência diz:

A educação constitui direito da pessoa com deficiência, assegurados sistema educacional inclusivo em todos os níveis e aprendizado ao longo de toda a vida, de forma a alcançar o máximo desenvolvimento possível de seus talentos e habilidades físicas, sensoriais, intelectuais e sociais, segundo suas características, interesses e necessidades de aprendizagem. Parágrafo único: É dever do Estado, da família, da comunidade escolar e da sociedade assegurar educação de qualidade à pessoa com deficiência, colocando-a a salvo de toda forma de violência, negligência e discriminação

Entretanto, apesar de ser repleto de palavras bonitas, o documento (que é espantosamente recente!) não é respeitado. E a raiz disso está na cultura do capacitismo, tão intrínseca ao nosso dia a dia. Afinal, como promover a inclusão em uma sociedade que insiste em “separar” a pessoa com deficiência das demais, por conta de suas características físicas e de uma série de suposições equivocadas e preconceituosas? Como lutar por uma escola inclusiva, quando ainda estamos combatendo retrocessos como o decreto recente da Política Nacional de Educação Especial, que foi revogado pelo STF em dezembro de 2020 e promoveu a segregação da pessoa com deficiência em “salas especiais” dentro do ambiente escolar?

20 janeiro 2021

A mídia anticapacitista: Produções audiovisuais protagonizadas por pessoas com deficiência

✎ Por Mayara Gonçalves

Aproveitando o clima de férias, resolvi assistir filmes, documentários e séries que abordam a temática da pessoa com deficiência para ajudar os educadores e educadoras a construírem uma base melhor sobre o assunto. Afinal, quem está em busca de melhoras em sua prática de ensino precisa ir atrás de informação de qualidade, né?

Quando a mídia escolhe retratar a vida de uma pessoa com deficiência, deve fazer isso de modo a contribuir para a humanização da PCD e não para reforçar estereótipos capacitistas (conheça mais sobre o termo neste post). Muitas produções têm surgido nos cinemas e nos grandes streamings sobre o assunto, e isso é muito legal - porque até alguns anos atrás era algo impensável. 

Você pode até se lembrar daquela novela Viver a Vida (que foi ao ar na Globo em 2009 e tinha a atriz Aline Moraes como tetraplégica) e falar: “esse foi meu primeiro contato com um relato anticapacitista!”... Mas não foi! Por isso, ao procurar material sobre o assunto, descartei todas as referências que apelam para a questão da superação e preferi algo mais próximo do real. 

09 janeiro 2021

Capacitismo: O que é e como combatê-lo no ambiente escolar?

✎ Por Mayara Gonçalves

No meu primeiro artigo aqui no Fala, Prô!, conversamos sobre a importância da curiosidade, e lá eu introduzi um conceito que ainda é desconhecido por muita gente: o capacitismo. Chegou o momento de falar mais sobre ele, e aproveitar para refletir acerca do papel da escola em sua desconstrução.

Imagem meramente ilustrativa. Fonte: Invacare.

Capacitismo é a discriminação ou violências praticadas contra as pessoas com deficiência. É a atitude preconceituosa que hierarquiza as pessoas em função da adequação de seus corpos a um ideal de beleza e capacidade funcional. Com base no capacitismo, discriminam-se pessoas com deficiência. Trata-se de uma categoria que define a forma como pessoas com deficiência são tratadas como incapazes (incapazes de trabalhar, de frequentar uma escola de ensino regular, de cursar uma universidade, de amar, de sentir desejo, de ter relações sexuais etc.), aproximando as demandas dos movimentos de pessoas com deficiência a outras discriminações sociais como o sexismo, o racismo e a homofobia. (Inclusive: Inclusão e Cidadania)

Segundo essa definição, o capacitismo é basicamente qualquer tipo de "pré-conceito" (no sentido mais profundo da palavra) estabelecido pela sociedade em relação à pessoa com deficiência. Este é um termo tão novo que muita gente reproduz o discurso capacitista sem nem se dar conta. E engana-se quem pensa que apenas as falas que inferiorizam o PCD são capacitistas. O capacitismo também perpassa qualquer discurso de supervalorização da pessoa com deficiência.

06 dezembro 2020

Retorno às atividades presenciais: um assunto urgente

✎ Por Ekatherina Ugnivenko

Após aproximadamente oito meses de pandemia no Brasil, o fim do ano se aproxima, assim como o encerramento de um ano letivo desafiador para alunos, famílias e professores. A pandemia ao redor do mundo já matou mais 1,5 milhão de pessoas, fazendo mais de 170 mil vítimas no Brasil. A educação, que é campo de luta e disputa, tornou-se terreno fértil para especulações sobre formatos e medidas necessárias para um retorno seguro às escolas. Contudo, as áreas que realmente deveriam dar suporte para a educação durante os tempos de pandemia estão há muito enfraquecidas, tomadas por discursos pouco propositivos, ou que sugerem soluções rudimentares ou reducionistas.

Crianças em sala de aula - imagem de FreePik

Enquanto exemplos de relativo sucesso para a manutenção do ano letivo de 2020 em outros países poderiam auxiliar a elaboração de modelos adequados para a pluralidade da educação brasileira em 2021, o último mês do ano se iniciou sem que qualquer plano tenha sido divulgado para o ano seguinte. Dentro deste cenário, a disputa se acirra, e um jogo de interesses incita a desunião entre as pessoas envolvidas no processo educativo, afastando a responsabilidade dos órgãos que obrigatoriamente deveriam orquestrar um retorno seguro, e que se eximem de sua obrigação primordial – colocar a educação como prioridade para o ano de 2021 em escala nacional. No caminho oposto, o Ministério da Educação anunciou um corte bilionário para orçamento de 2021.

O assunto é urgente e precisa mobilizar a sociedade como um todo, principalmente os profissionais da educação. Para a elaboração de planos de retorno, além de investimentos massivos na educação pública, é necessário que haja discussão extensiva e contínua sobre o tema, antes que um retorno obrigatório surpreenda professores e alunos. Até o momento, o Ministério da Educação está resistindo em homologar a permissão das aulas remotas em 2021, o que evidencia intenções pouco democráticas acerca de flexibilizações do modelo escolar para que sejam condizentes à evolução da pandemia nas diferentes regiões. 

Destacamos que o Fala, Prô! é contra a volta às aulas enquanto o Brasil for o epicentro da atual pandemia de COVID-19 e não houver um plano bem elaborado para o retorno seguro. Nossas publicações têm como propósito trazer reflexões e sugestões de vivências que contribuam para a realidade de professoras, professores e demais atores do contexto escolar.

O QUE DIZEM OS ESPECIALISTAS DA ÁREA DA SAÚDE?

É necessária muita cautela ao analisar e utilizar dados sobre a transmissão de Covid-19 em crianças. Na semana passada, um grupo de pediatras brasileiros sugeriu por meio de uma mobilização digital que a atenção pública se voltasse para a reabertura das escolas. A campanha aponta que as crianças se contaminam menos, transmitem menos e manifestam a doença de maneira menos grave. Contudo, é preciso muito cuidado ao concordar com estas afirmações. Os estudos neste sentido ainda são especulativos, pois a experiência em relação ao retorno às aulas ainda está sendo vivida e analisada ao redor do mundo. Além disso, há diferenças socioeconômicas e culturais que impactam na forma como as crianças se relacionam dentro e fora dos muros da escola. Sabemos que quanto menores as crianças, mais próximas são as trocas sociais e menor é o autocontrole sobre suas ações e sobre sua higiene.

02 dezembro 2020

O papel da curiosidade e do educador ativo na vida escolar da criança com deficiência

✎ Por Mayara Gonçalves

Ao longo da vida passei por vários desafios enquanto pessoa com deficiência. Desde pequena, apesar de não ter muita consciência disso na época, sempre quis entender do que meu corpo era capaz, mesmo sendo diferente dos outros. Brincar na rua, apostar corrida, pular corda, me sujar de terra e fazer coreografias, eram algumas das coisas que mais me encantavam, apesar de eu não executá-las.

Ilustração elaborada por Anex Santis exclusivamente para o Fala, Prô!. Cópia, utilização ou distribuição proibida.

Mesmo encontrando formas mais caseiras de brincar (minhas bonecas diriam que algum dia serei uma excelente mãe!), sempre tive essa curiosidade sobre "o que há lá fora?" e, consequentemente, "o que há aqui dentro, que me impede de viver experiências como aquelas?". Então, ao ser convidada para iniciar meus trabalhos como colaboradora do Fala, Prô!, pensei em resgatar a importância dessa curiosidade na minha vida e propor algumas alternativas para educadoras e educadores que querem estimulá-la em crianças ou adolescentes que tenham uma deficiência.

A importância da curiosidade

Aaaah, a curiosidade! Essa nos leva ao infinito, mesmo que seja fisicamente impossível chegar até lá. Ela nasceu com o ser humano e vai acompanhá-lo até o último segundo de vida, e pouco importa se uma deficiência qualquer entrou na jogada. A curiosidade existe em todos nós e proporciona a evolução. E é preciso dizer: muitas vezes, ela está até mais presente na criança que possui uma deficiência, justamente pela quantidade de privações às quais ela é exposta durante sua infância. Se tem uma coisa que eu aprendi na minha jornada de descoberta, com certeza é: para evoluir, é preciso sentir uma porção de coisas, sejam elas boas ou ruins. E, quando nos divertimos no processo, tudo fica mais legal.

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